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domingo, 10 de abril de 2011

GRITOS FRANCESES

Fui dormir e no horário local eram quase 2h da manhã. Esta diferença de mais 5 horas no fuso horário está difícil de acostumar.

Dormi depois de um tempo, com a cabeça a transbordar de sentimentos confusos. Mas dormi. Havia ainda conversas na rua – sendo hoje sábado, por aqui.

Mas acordei ouvindo gritos. Dos mais terríveis – eram de um homem e vinham de um lugar muito próximo, senão logo abaixo da janela de onde estou, em uma linha lateral muito próxima, na calçada. Parecia aqui, dentro da casa. Haviam duas vozes, o que gritava e outro, enfurecido. As batidas ouvia-se claramente, e do outro só conseguia entender o “Non, s’il vous plaît, non.. Porquoi? S’il vous plaît!” Era um desespero absoluto, e corri para a janela de vidro tentando enxergar algo. Não via. Meu corpo todo tremia, e eu a tentar entender o quê diziam, porque, querendo que parassem. Os murros ecoavam na noite, faziam doer os ouvidos. Falavam alguma coisa relacionada a horas, mas eu não conseguia entender mais. “Non, s’il vous plaît!” Nenhuma janela se abria, não se ouvia mais ninguém, parecia que o mundo todo dormia. E eu encolhida, ao lado da janela, a tremer de medo e horror.

Dali a pouco pararam. Eu continuava sem entender. Alguns segundos depois, um carro parou ao lado, e seguiram conversando. No carro que chegara, uma mulher com aparência de homem, ou o contrário talvez.

Pouco depois outros carros passando, e os motoristas a olhar aqui para baixo, em um lado próximo. O quê havia?

Um dos carros parou mais à frente, deu ré. Uma moça. Abriu o vidro, pediu informação na direção dos que ali estavam. Se aproximou, vindo debaixo da janela em que eu estava, um homem, careca, muito branco. Veio um segundo, e a mulher que chegara com o carro. Meu corpo seguia tremendo, e se fizessem algo com ela, o quê faria eu? Para quem gritaria, como ajudaria, como, estando eu aqui sozinha sem conseguir sequer me comunicar?

Dos homens, nenhum ferido. Até que o de voz mais forte chamou os demais e disse algo do tipo “vamos embora” vindo para a calçada, enquanto a moça do segundo carro agradecia a informação e saía em frente, acelerando lentamente. Saíram, os três, no carro da mulher/homem.

Fez-se silêncio.

Voltei a deitar, tentando entender. Eu não havia sonhado, nem bebido, nem nada. Havia visto, e ouvido. Nada aqui me soara tão forte. E não conseguia entender. Não vira nenhum arranhão, nenhum ferimento, não mancava, mas ouvi. Não conseguia dormir, também, a tremer.

Fez-se silêncio.

E mais silêncio.

O relógio marcava próximo das 5 horas da manhã, e a escuridão seguia lá fora.

O quê fôra isso?

E dali a pouco tornei a ouvir a voz, a mesma. Agora mansa, agora baixa, ainda triste. “Porquoi? Porquoi?” Ouvi como se batesse em portas. Tentei enxergar, não o vi. Não tinha o que fazer. Enrolei-me bem forte em meu saco de dormir que fingia aconchego e rezei fortemente para um deus ou deusa que não sei o nome, mas que acho que me ouvia. Ajuda esse homem, seja lá quem for. Seja lá o quê fez. Ajuda esse homem!

Fez-se silêncio.

E não sei mais o que ocorreu nesta noite, sigo sem dormir.

5 comentários:

  1. Genifer,
    gritos franceses devem ser aterradores.... Principalmente para nós brazucas,rsrsrs. Durma anjinha, que teu caminho apor ai é repleto de luz e delicadezas. Vc tem muito o que fazer por aí pra abrandar corações com tua arte....
    Abraços da tua fã
    Doris

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  2. que texto angustiante. caramba -> era pra ser uma palavra de baixocalão mas me bateu uma subita vergonha :P

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  3. Siga em paz minha querida
    Adversidades existirão sempre...
    As flores, os perfumes, as alegrias virão...

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  4. Em uma cidade tão tranquila como Charlesville dever ter sido aterrorizante mesmo, hehe... aventuras francesas, faz parte!

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  5. que coisa! Um verdadeiro conto kafkiano!! Imagino o susto! POrém tb sei que franceses gritam muito.
    abraço
    Angela

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