Algo em mim sussurra, tão alto que posso ouvir em gritos. Algo dentro de mim triunfa o que não foi feito, e goteja em pequenos pontos brancos, e em um piano que roda no céu da praça de Valladolid.
Acabo de assistir ao espetáculo belga Carrousel des Moutons. Sem uma palavra enfeitiçou meu coração, encharcou-me de desaventuras, de nascimento, de desejo de parir poesia. O som do piano passeia ainda em mim.
Em seguida, assisti ao palhaço Leandre, da Espanha, um monstro silencioso de ouvidos e olhos tão atentos que parece não ser possível ser. E é. Com um espetáculo todo troca, traz o público para cena como quem brinca com as mãos em andar de ônibus. É sua casa, ali, a rua.
Eu de cá, depois de ver estes dois, sigo sem entender o mundo. Mas pouco a pouco tenho uma visão breve e mais clara do porquê do meu mundo, do que quero, do que posso fazer com minha vida. Um sentido. Como uma mão pequena que hai encontrado um dedo materno ou paterno, e segurando firme faz adormecer criança tranquila. Algo em mim mudou com este piano, com este olhar. Algo quer se mostrar, quer nascer. Não sei o quê é. Mas faz-se sentido maior assim o circo, os bonecos, a arte, os porquês. Mesmo um sentido brando e macio, nunca certo. Algo em mim quer nascer. Suas raízes estão agarradas em mim desde a viagem pelo Brasil, e agora a terra fértil encontrou semente a esperar o tronco, as folhas, as flores. Do fruto não me preocupo em pensar agora – sempre foi assim. Mas a árvore quer vida. Algo em mim quer nascer, quer brotar, quer viver.
E eu olho para isso com ternura, saudando o silêncio que fez-se em mim esta tarde.
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