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terça-feira, 31 de maio de 2011

15M e um “final” da jornada

Barcelona/Espanha, 31 de maio de 2011

Teve fim o segundo festival. Uma overdose seguida de outra!


Agora tenho-me em Barcelona, passar o dia por aqui. Falei com Ana, falei com Felipe, filho de Angela, que lá moram. Venha para cá, tome café da manhã conosco. Fui. Toquei o interfone cedo, suba! Comi com eles, longos anos que não os via. Papo ligeiro em apartamento aconchegante. Depois deu-me Felipe orientações: pode ir aqui, andar por essas ruas, conhecer isso e isso e se perder por estas, é bom para percorrer o desconhecido. Indicou-me o mapa, deixei meu mochilão e lá fui eu.


Vi igreja Sagrada Família com os homens pequeninos pendurados a fazer restauração. Vi casas de uma arquitetura torta, Casa Battló, Casa Milà, e turistas com suas máquinas apontadas, como eu. E mais abaixo vi praça espanhola recheada de gente, estátuas com protestos, com roupas, com explicações e pedidos. ‘Movimento 15M’ chama-se, uma organização surgida na Espanha a fim de protestar a favor de uma democracia real, com propostas. Dizem: “a crise não é nossa”, e as propostas são. A praça, dividida em comitês com soluções concretas, diz-se que cada vez enche mais de gente. Assim como as praças de toda a Espanha (em Valladolid a praça também estava cheia, pessoas de todas as idades acampando e debatendo pelo movimento). Não duvido que estava à frente de algo que em pouco tempo pode se espalhar pelo mundo como sementes em vento de campo. Senti-me forte cá estando, senti sentido no protestar, não algo de jovens que só por querer o diferente saem às ruas sem nada de concreto a gritar.


Depois me perdi, e voltei de metrô porque hora já era de pegar o trem e ir ao aeroporto.


Tchau Felipe, obrigado por tudo, levou-me à estação de guarda-chuva para garoa não me encharcar. Metrô cheio, anda anda, cheguei no aeroporto, de volta ao Brasil.

Tenho mais a dizer, já já digo.

sexta-feira, 27 de maio de 2011

Sussurros


Algo em mim sussurra, tão alto que posso ouvir em gritos. Algo dentro de mim triunfa o que não foi feito, e goteja em pequenos pontos brancos, e em um piano que roda no céu da praça de Valladolid.


Acabo de assistir ao espetáculo belga Carrousel des Moutons. Sem uma palavra enfeitiçou meu coração, encharcou-me de desaventuras, de nascimento, de desejo de parir poesia. O som do piano passeia ainda em mim.


Em seguida, assisti ao palhaço Leandre, da Espanha, um monstro silencioso de ouvidos e olhos tão atentos que parece não ser possível ser. E é. Com um espetáculo todo troca, traz o público para cena como quem brinca com as mãos em andar de ônibus. É sua casa, ali, a rua.


Eu de cá, depois de ver estes dois, sigo sem entender o mundo. Mas pouco a pouco tenho uma visão breve e mais clara do porquê do meu mundo, do que quero, do que posso fazer com minha vida. Um sentido. Como uma mão pequena que hai encontrado um dedo materno ou paterno, e segurando firme faz adormecer criança tranquila. Algo em mim mudou com este piano, com este olhar. Algo quer se mostrar, quer nascer. Não sei o quê é. Mas faz-se sentido maior assim o circo, os bonecos, a arte, os porquês. Mesmo um sentido brando e macio, nunca certo. Algo em mim quer nascer. Suas raízes estão agarradas em mim desde a viagem pelo Brasil, e agora a terra fértil encontrou semente a esperar o tronco, as folhas, as flores. Do fruto não me preocupo em pensar agora – sempre foi assim. Mas a árvore quer vida. Algo em mim quer nascer, quer brotar, quer viver.


E eu olho para isso com ternura, saudando o silêncio que fez-se em mim esta tarde.

quinta-feira, 26 de maio de 2011

Entrevista na TV


Genifer que fala espanhol melhorzinho fala, vovó na mão. Ismine apresenta a caixa dela. Denise auxilia.
1, 2, 3, no ar, ao vivo.

Ai que nervoso


(e esse moço nervoseando mais a gente!)

Valladolid / Espanha, 26 de maio de 2011

Chegou Denise dos Santos, chegou Ismine Lima – criadoras do Lambe-Lambe. Chegaram bonecas da mãe de Denise, delicadezas negras, chegou boneca grande de pano para bailar com ela.
Eu sigo andando nas ruas de Valladolid, com mapa na mão, onde fica essa praça, e essa? Sigo vendo, me impressionando, rindo.
Apresentamos no Festival, 4 caixas enfileiradas em 2 dias, uma para visitação as demais com histórias, uma fila grande, gente 30 minutos antes do início divulgado. Contagem de gentes para não ficarem esperando à toa: até aqui dá para assistir nestas duas horas, a partir daqui não mais. Vão-se ver outras artes, enorme é a programação.
Ficamos em hotel de chiquezas, corredor comprido de tapetes ao longe, almoço para o Festival inteiro, tem entrada, tem prato principal, vinho delicioso à vontade, tem sobremesa... Já escolheram o quê em qual posição do cardápio, moças? Tem equipe de produção que auxilia a gente, Tulani querida e disposta na correria para tudo dar certo, tem Ana e conversa de vida e relacionamentos em carro e sob garoa fina, tem Maria e seu marido de sobrenome Amigo a fotografar e filmar e rir. Tem namorado de Tulani, Carlos, simpático e prestativo também. Tem gente que se vê no olho amiga, e é bom demais reconhecer.





Na noite também temos visto maravilhas, percussão com luzes, bonecos/lobos enormes com seus olhos que brilham, sons e garras a assustar a plateia que foge e fotografa com suas máquinas ao ar. Tem museu francês de objetos e máquinas artesanais a atiçar carinho na gente. Tem apresentação nossa em loja também, troca, apresentamos aqui e nos ajudam ali, e apresentação no Sabor Brasil, o restaurante brasileiro de gente que vive cá há anos e não perde o sabor de lá. Simpatia pura, da cozinha ao balcão, dos pequenos aos grandes, do suco de manga ao feijão.









Tem outro Carlos a tocar música espanhola entre dedos que se misturam com fios e fazem do instrumento um trá lálálálá sem igual (como pode brotar lindeza e grandeza de música e sons de duas só mãos, em um só violão?).


Tem ideias saltando e gritando do asfalto nas ruas de cá.





quarta-feira, 25 de maio de 2011

Chegada no XII Festival de Arte e Teatro de Rua de Valladolid

Valladolid/Espanha, 25 de maio de 2011


Cheguei na cidade, como disse 26 horas depois da minha partida da França. Foi uma chegada estranha, desembarquei 10:45h da manhã, liguei para Tulani (a produtora cultural que possibilitou a minha vinda para cá) e ela disse estou indo, vamos direto à coletiva de imprensa. Coletiva? Sim. Começa às 11h, estava com medo que não conseguiríamos chegar.


No taxi penteei meus cabelos com 3 dedos finos. Chegado no lugar, deixe sua mochila e caixa ali, segue-me, uma sala grande inundada de repórteres em cadeiras, câmeras fotográficas, filmadoras igualmente longas como gansos orgulhosos em rios.


Primeiro uma foto, aqui aqui, éramos uns 7, xis, plim plim plim os flashs de todos os lados. Sentem-se na mesa, 7 lugares, águas, microfones, impresso o meu nome na plaquinha veja só como são as coisas. Olhei para Tulani ao meu lado, sussurrou falamos do que é o Teatro Lambe-Lambe e respondemos as perguntas. Concordei com a cabeça em balanço suave. Fala espanhol? Engano. Dale, está bom!


Falou o moço da direita, de camisa listrada e meia verde abacate. Foi traduzido em seu inglês animado. Falou outro grupo estrangeiro, 2 ou 3 mentes. Estávamos no meio, falem vocês agora. Isso e aquilo, uma pessoa por vez assiste ao nosso espetáculo particular, nem sabia eu para que câmera explicava. Entenderam meu espanhol improvisado. Falou Tulani. Falou o grupo da esquerda. Perguntaram alguma coisa, responderam outros. Acabou-se. Gracias!


(Achei engraçado. Senti-me importante, até, com tantos ouvidos ao meu dispor.)


Depois pegamos as coisas, deram-nos os tickets para refeições, a programação, 65 cias, 260 apresentações, 16 países neste hotel. Tulani disse desculpe a correria. Não, engraçado é.


Poucas horas depois estava eu em um estúdio de rádio. A rádio mais importante da região, vão fazer uma entrevista com você. Eu disse tá. Radialista simpática, sorridente deixou-nos a vontade (Tulani e eu). Falávamos as três na sala marrom embolotada. Falamos bastante nos microfones bonitos. Ficou ela curiosa para ver as caixas de teatro em miniatura. Gracias, hasta!


Quase noite, já, fomos ver dois espetáculos que abriam a programação do Festival. Este se encerraram os ingressos, de sala é. Aquele é na rua, colocaram arquibancada para 500 pessoas, tem mais de 1.000 à espera. Voltamos amanhã, o hoje se despede de sono.


Entendi o tanto de produção, de divulgação: o porquê de tanta gente. Vamos ver como vai ser o pequeno Mundo em tão grande Festival.

terça-feira, 24 de maio de 2011

Madri/Espanha, 24 de maio de 2011

Acho que tenho visto tanta coisa que às vezes penso mesmo que vou explodir em mim.


De ontem para hoje, durante as minhas 26 horas de meditação/viagem de ônibus, transbordei um pouquinho. No balanço leve, reformulei Gringa Errante. E tenho-me um pouco mais aliviada do que brotou em mente, liberdade, caneta, papel e possibilidade de vazio.

segunda-feira, 23 de maio de 2011

Vâmo lá para casa!

Charleville-Méziéres, 23 de maio de 2011


Não deu tempo de escrever muito. Muita coisa acontecendo dentro e fora de mim.


O Mundo Miúdo fez sucesso, bastante assistido. Foi até senhor da Unima para ver, tendo ouvido falar de mim (óia que chiqueza!)


E hoje, tendo acabado, Violaine e Evandro me convidaram a ir para a casa deles, em Charleville. Cá viemos, noite, e nós de chapéus trocados à espera de trem, entre risos e bocejos.

Ajudaram-me a ver as passagens, grandes grandes grandes grandes grandes grandes grandes pessoas! Meu carinho veste branco, veste azulbrancovermelho, boniteza de amizade.

domingo, 22 de maio de 2011

A musicista que está na mesma casa que eu traz na voz e violão o infinito.

Lança seu CD depois de amanhã.

Atrevi-me a comprar

(sabe-se lá quando se encontra o infinito à venda de novo?)

Reims / França, 21 de maio de 2011

Hoje havia apresentações à tarde e noite. Sendo a tarde pior ara mim pelo excesso de sol a queimar o espírito, apresentei mais à noite. Aproveitei a tarde para assistir.
Vi reconstituição policial em maquetes e projeções, bonecos duros vivos a falar com gravador.





Vi banheira de gente, de velho, de soluções para um mundo sem liberdade e fraternidade reais.


Vi mulher do avesso em porta, quase chorei com pequenice em janela de vidro a bisbilhotar meu peito de possibilidades.



Vi menino com arma na mão, « sou eu quem decide », bang !



Encontrei grupo do Brasil, uma cena erótica com bonecos de fio, Cia Pigmaleão Escultura que Mexe de Belo Horizonte (MG), marionetes lindos a mostrar as partes e os olhos sem vergonhas.



Vi Violaine e Evandro na « Fábrica Marionética », confeccionando bonecos e ensinando durante todo o tempo em um ateliê improvisado e cheio de belezas e pedaços em quadrinhos de madeira.



Vi moço/clown em cenário vazio a dar vida à vassoura e livro, e corpo suado de energia brotante.



Vi menina-bicho a tirar as tripas de pelúcias delicadas.



Vi moço com areia, grito, pegadas vermelhas, grãos de gentes.



Vi tudo isso com brilho nos olhos, mundo grande e novo mundo de aceitações do irreal.



P.S.- Fotos de divulgação dos espetáculos, do site http://www.orbispictus.fr/

sábado, 21 de maio de 2011

Orbis Pictus – Festival de Formes Brèves Marionnettiques

Reims / França, 20 de maio de 2011


Viagem tranquila até uma Paris de metrô grande a percorrer escuridões. Quinze horas de medidar em ônibus pela Itália e França.


Chegando em Paris, já sabendo o caminho, fui aos trens da Gare d’est e cheguei em Reims, cidade do Festival. Laurène já me aguardava na estação mesmo sem me conhecer, Genifer? Ça va? Oui, oui...!


O Festival foi todo realizado no Palais du Tau, ao lado da Catedral Notre-Dame de Reims, famosa por ter sido local de coroamento de antigos reis da França, e cuja história carrega também a presença forte da Joana D’Arc. Com seus vitrais belos a colorir as máquinas fotográficas dos turistas (dentre eles um vitral feito por Chagall) e suas velas compridas como pescoços em curiosidades a olhar os santos, a Catedral carrega em sua frente imagens das mais distintas e delicadas. E em seu topo duas torres inacabadas retratam uma igreja sem chapéu, a se abrir ao sol.


No palácio, a preparação para as cenas breves preenchiam as salas, imensos espaços com seus tapetes e esculturas cobrindo as paredes, grandiosidades em pedras a fazer vigília constante.


Após um tour em francês com Laurène, deixou-me ela na área externa, local de integração e comilanças. Logo chegaram Violaine e Evandro, brotando em abraços, saudades já.


Ficamos lá, arrumei o Mundo Miúdo que também será apresentado nesta parte externa ao lado da Catedral (inundando meus olhos de detalhes, nos intervalor), assim como Punch et Judy e mais duas outras cenas.


Depois me levaram à casa onde irei me hospedar junto com uma musicista, a Emilie – em um apartamento onde nos entregaram as chaves e não há mais ninguém. Ficamos em quartos separados, mas nos juntamos para conversar na sala e cozinha. Bom, nos entendemos, meu francês de um mês de estudos não está tão mal.


Na noite que aqui escurece tarde a abertura oficial do Festival, bienvenue todos, blábláblás, champagne e palitos com queijos, tomates, coisas gostosas que não sei dar nomes. E o início das apresentações, como sugere o título : cenas breves, de no máximo 30 minutos, e a minha de dois com fila e olhares atentos.


Comida dentro do ônibus vermelho-clássico e pessoas a se conhecer e trocar. Belezura !










































sexta-feira, 20 de maio de 2011

Impossível embarcar!

Milão / Itália, 19 de maio de 2011


Voltamos ontem à tardinha, Fragitsa um abraço e dois sacos de café grego. Hoje o retorno à França. Tendo conhecido Violaine e tendo ela conhecido o meu trabalho, indicou-me ao grupo e fui convidada a participar do Orbis Pictus 2 – Festival de Formes Brèves Marionnettiques com o Mundo Miúdo. Grande oportunidade de troca. Começa amanhã, três dias tem.


O avião saía às 6h do cedo na estação Bergamo-Osio, mas para se chegar lá é um grande percurso. Tendo ido dormir às 1:30h, saí da casa da Vili às 2h da madruga. Peguei o coletivo das 2:27h na noite colorida de lua cheia e o ônibus para a estação às 3h, últimos horários. Cheguei na estação por volta de 4:30h, 2+1+1,5.


Sabendo que a empresa escolhida – mais barata – era mais restrita à bagagem, comprei junto ao bilhete mala extra no porão e tratei de colocar todas as minhas roupas – era eu uma bola de tecidos sobrepostos. Na mão, tirei tudo da sacola do ‘Mundo Miúdo’ tendo restado apenas a caixa, frágil, para se ficar menor e a me acompanhar com cuidado.



Na estação/aeroporto gente dormindo por todos os lados. Sobre as esteiras, nos cantos, no centro, roncando ou sonhando (ou ambos, certo também). No chão eu arrumava meu mundinho particular e comia a pizza que a Vili tratou de colocar toda na minha mala, junto a maçã e salgadinho.


No horário marcado, embarque. Cheguei no check-in da Ryanair e tudo que ouvi, em italiano que não sei reproduzir, foi: esta é a sua bagagem de mão? Sim. Impossível! Medi, e era 1 e meio os centímetros da lateral que passavam do marcado.As outras medidas todas estavam bem abaixo do exigido, só aquela. Não houve jeito. É impossível, repetia ela. Tentei explicar, não posso despachar porque é frágil, é o meu trabalho, é impossível, tente outra empresa então – respondia sem vacilo. Assim, seca, acompanhada pelo coro da colega à sua direita. Eu tentava, tentava e nada. Mandou-me à outro lugar, e ouvi o riso das duas pelo meu aparente e real desespero assim que dei as costas.


A moça do outro guichê falava espanhol. Foi mais atenciosa, a explicar não pode, só se despachar e custa 40 os euros. Eu no total nem isso tinha nos bolsos. Pode ressarcir o valor? Não. Pode devolver o valor da outra passagem, para Madri, 5 dias depois e que também não poderei embarcar, assim? Não. Vi ante o vidro meu dinheiro todo batendo asas, e eu em desespero tentando agarrar. Mas não havia jeito. Andei para lá e cá, o quê faço agora, festival com contrato assinado, o avião já havia ido, e agora?


Tentei não ligar para Vili, mas não houve jeito: Vili, desculpe, estou aqui ainda, isto e aquilo. Passagem em outras empresas é mais caro, pensei ônibus. Como faço para chegar na rodoviária? Xingou a empresa comigo. Deu-me as coordenadas – é em tal lugar, custa tanto. Voltei mais uma hora e menos dez euros, metrô, outro, outro, lado errado, volta, cheguei à estação de ônibus horas depois. Moça, tem ainda? Tem. Sai às 16:45h. Passa cartão? Passo. Passou. Não deu.


Moça, onde saco dinheiro, a rapa do tacho? Não sei.


Moço jornaleiro, onde saco? Ih, é longe. Para lá.


Moça? Não sei.


Moça da recepção 2 quadras depois, onde saco? Pra lá, mais.


Moço da esquina, 10 quadras depois, onde saco? Dobra ali...



O problema não foi só o longe. Andar não me doi, mas com quilos de bagagem até um passo torna-se eterno em dor de costas e de peso. Vestida com 10 quilos de roupas, a água brota do corpo como brisa na noite que enxarca as folhas. Em frente ao caixa eletrônico, por favor, por favor, que eu consiga. A água já brotava também de meus olhos quando a máquina sorriu seca dizendo que não era possível, não reconhecia o cartão estrangeiro. Como não? Volta tudo, já não pensava, sol comendo o cabelo no topo. Olhava para cima, por que? Olhava para os lados, por que? Fechava os olhos, eu não entendo. Não havia dinheiro em mãos, nem possibilidade breve de tê-lo. Parei no meio da calçada, meu suor confundia-se com meu pranto, meu desespero também. Minha Nossa Senhora do Não Consigo Entender, o quê há? As pessoas passavam e olhava, só. Não queriam fazer parte de minha dor. E depois de muitas, uma tentou ajudar. Mas liga para o Brasil, vê o quê há. Como? Tentou ajudar, mas não sabia o que fazer também.


Quis casa.


Quis colo.


Quis retorno.


Quis morangos.


Eu quis o simples, só o pequeno.


Voltei para a estação. Não sabia o que fazer, e nisto fiz algo que não tinha certeza do querer: liguei para a Vili, em plena aula dela. Vili, não sei mais o quê fazer, tenho vergonha em ligar, mas tenho medo de um não-ir, tem ideia? Eu vou aí, disse ela. Me espere, estou indo.


Ela pegou greve de metrô, por isso levou horas. E chegou com um sorriso grande, eu ainda com meus quilos a mais e gritos na garganta, não se preocupe, tudo certo, abra um sorriso também. Sorriso com desespero, e ela conseguiu meu olhar com esperança de ainda chegar. Emprestou-me dinheiro, mesmo quase não tendo. Eu em poucos dias passei a devedora. Sei que e como vou pagar – ambos festivais que irei participar pagam, só demora um pouco. Mas não gosto de dívidas, de acúmulos para o se fazer de amanhã. Agora devo à todos, e ainda assim a Vili conseguiu alegrar-me, tranquila e confiante: são só coisas. O dinheiro, se paga. Mas o que você vai ver e trocar, nisso não há preço. Nisso há só o hoje, aproveite, é um investimento. E é, sábia garota.


Liguei para Violaine, acertei os ponteiros. Tomei um café e tirei as roupas.

No ônibus, o mesmo motorista da vinda, nenhuma complicação com bagagens. Amanhã chego na manhã.

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Mundo Miúdo na Grécia

Levei, de início, porque quis comprar cafeteira italiana para mãe. Dessas que se coloca o pó embaixo e ferve, e fica bom como passado. Como pó passado.

A Vili ajudou-me pondo o pedestal em diagonal em sua mala. E viemos com os pequeninos.


A primeira apresentação do Mundo Miúdo na rua foi com a Acrópole ao fundo, na tardinha em que chegamos. Uma noite abençoada nos tocava os ombros.


Não apresentei muito. Em verdade, algumas pessoas se aproximaram, perguntaram, e eu sem entender o grego, e eles sem entenderem a mim. Muitos olharam de longe, e alguns a assistir, regando meu chapéu de euros.


No outro dia assistiu Manolo, assistiu Álvaro, o pessoal da “favela”. Menino a ver também, na frente e nas frestas. Na rua escolhida, Fragitsa me acompanhou como personagem que dizia às pessoas sobre o Mundo como em segredo, mas nos pareceu que sentiam certo medo ou não-curiosidade em se aproximar. Ainda assim, dividimos os euros.


Depois, cartaz em grego, mas já era fim a viagem. Tendo gasto muito só com comida, Acrópole, cartão-postal para tia e transporte e nada, nada mais, não foi suficiente para comprar a cafeteira. Dizem que na Espanha também há cafeteiras assim. Tomara que dê, tomara!

quarta-feira, 18 de maio de 2011

Despedida de Álvaro



Álvaro e Manolo são artistas de rua – o primeiro do Uruguai, o segundo grego. Palhaços, trapezistas, jovens/homens livres a colorir as praças do mundo. Moram na casa que chamam de favela (com referência ao Rio), assim como Fragitsa. No entanto, Álvaro se vai. Parte amanhã para China com seus 8 idiomas. Ficará 6 meses. E depois, sendo da rua, não prende certeza em nada.


Estes artistas parecem com os da Cia El Indivíduo, de Minas. Trabalham muito rua, em todas as horas, com várias alternativas de atuação. Trabalham duro, e vivem bem disto.


Os vi quando se apresentaram juntos na praça, monociclo, corda bamba, cachorro a fazer parte dos números. E estivemos com eles a ir e vir na casa movimentada. Na “favela”, hoje houve festa de despedida. Juntaram-se uns amigos e cantaram em um chinês inventado regado a uma cachaça local homenageando Álvaro.


Disse adeus, arrumou a mala à noite com os amigos – acordeon ou trombeta? Este figurino ou este? Isto ou aquilo?


Se vai. Com sua energia forte brotando nos olhos escuros e seu nariz vermelho embolotado à frente da face.

terça-feira, 17 de maio de 2011

Cabo Sounio / Grécia, 17 de maio de 2011

Sempre bom retornar ao mar. Ele, senhor do azul, segue seu ritmo doce. E não importa onde se chega nem onde ele está – afora momentos de fúria, é sempre o mesmo, a ir e vir em carinhos brancos.

O mar é como as estrelas mortas no céu noturno: quando se olha para ele sempre se pode olhar junto. Um mesmo ponto que une dois olhares que imagina-se nunca serem capazes de se unir, mas lá estão, a observar o além, o mesmo, o que não se explica, que se admira e respeita.

Aqui o mar consegue ser mais transparente, e verde, e parece macio a suavizar o olhar.

Um presente esta minha vida. Aos pés da imensidão enxergo o quê fora noutros tempos construído por homens, e o que cá está e cá esteve. A vida faz sentido assim, sem pressas, sem medos, sem certezas, sem respostas.

Olho para o Templo de Poseidon (do Deus do Mar) e o admiro, ainda sem saber sua história. Mas a invento, e nisto há sabor de descoberta. São, hoje, as minhas histórias tão reais como as que contam os sábios. Porque quando não sou eu quem inventa, é alguém que sublinha, e nisto também não há criação?

Ao longe um barco com lenço deixa seu adeus de onda clara que se esconde no azul/verde gritante. Ao longe ilhas que mal pode-se ver, o olho falha no belo. No papel um inseto preenche o branco de vida. Lento e faceiro a vibrar as pequeninas antenas, não é nada além do que é. E assim preenche minha folha de vibrar de antenas, presença intensa e sentido mudo.